Escrito por Cristina Ruffino, na Série Externalização #5.
A externalização do problema pode ser uma abordagem particularmente valiosa no caso de lidar com ideações suicidas. Esta abordagem, que envolve tratar o problema como algo separado da pessoa, pode oferecer uma nova maneira de entender e enfrentar esses pensamentos dolorosos e muitas vezes esmagadores. Quando alguém está enfrentando pensamentos suicidas, é fácil para essa pessoa sentir-se identificada ou consumida por essas ideias. Ela pode começar a acreditar que esses pensamentos são uma parte intrínseca de quem ela é. Aqui é onde a externalização pode ajudar significativamente. Ao visualizar os pensamentos suicidas como um agente externo ou uma força separada que está invadindo a mente, é possível criar uma distância psicológica entre a pessoa e os pensamentos. Essa distância pode ser extremamente libertadora. Em vez de lutar contra si mesma, a pessoa passa a lidar com um desafio externo. Isso pode reduzir a intensidade da autocrítica e da vergonha, que muitas vezes acompanham ideações suicidas. Ao externalizar, a pessoa pode começar a perceber que, embora esses pensamentos estejam presentes, eles não a definem e, mais importante, não precisam ditar suas ações. Além disso, a externalização pode abrir espaço para uma melhor intervenção de apoio, seja de amigos, familiares ou profissionais. Quando os pensamentos suicidas são vistos como um problema externo, torna-se mais fácil para outras pessoas oferecerem ajuda. Eles não estão lutando contra a pessoa, mas sim ao lado dela, contra um desafio comum. Criar uma separação entre a pessoa e seus problemas, no caso os pensamentos perturbadores, pode reduzir a sensação de isolamento e desespero, encorajar o apoio e a intervenção, e servir como um passo importante no caminho para a recuperação e a saúde mental.
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Escrito por Cristina Ruffino, na Série Externalização #4.
Lidar com o uso de drogas dentro da família é uma tarefa desafiadora, mas abordar essa questão sob a ótica da externalização pode oferecer uma nova perspectiva, tanto para a família quanto para a pessoa que está lutando contra o vício. Externalizar o problema significa vê-lo como um invasor externo, e não como uma falha ou deficiência do indivíduo. Quando uma família começa a ver o vício em drogas não como um problema intrínseco de um membro, mas como um desafio externo que afeta a todos, a dinâmica muda. A pessoa que está usando drogas não é mais rotulada como o "problemático" ou o "viciado". Em vez disso, o vício é identificado como o inimigo comum que todos estão enfrentando. Isso pode ajudar a reduzir a culpa e a vergonha que frequentemente acompanham o uso de drogas, tanto para o indivíduo quanto para a família. Essa abordagem também pode fortalecer a união familiar. Ao invés de isolar o membro que está lutando com o vício, a família pode se unir para combater esse intruso externo. Isso não apenas proporciona um apoio crucial para a pessoa que está enfrentando o vício, mas também ajuda os outros membros da família a se sentirem mais capacitados e envolvidos na solução do problema. A externalização pode abrir caminho para uma comunicação mais aberta e eficaz. Em vez de acusações e discussões carregadas de emoção, as conversas podem se concentrar em como conhecer as ações e intenções do problema e pensar formas de identificar recursos para apoiar a pessoa em sua jornada de resistência. Ao mesmo tempo, permite que a família explore e aborde as circunstâncias que podem ter contribuído para o surgimento do vício. Em suma, abordar o uso de drogas na família a partir de uma perspectiva de externalização pode ser uma forma poderosa de enfrentar o problema. Ao reconhecer o vício como um inimigo externo, a família pode se unir em um esforço comum para apoiar seu ente querido, fortalecendo os laços familiares e promovendo um ambiente de recuperação e compreensão. Escrito por Cristina Ruffino, na Série Externalização #3. Tenho enfrentado, junto com alguns clientes, o desafio de minimizar o poder do Alcoolismo da vida deles e de suas famílias. A terapia narrativa tem sido a lente com a qual percebo que é possível falar com os clientes e suas famílias a partir de um lugar de maior agência e controle de si e da situação. A jornada pelo mundo do alcoolismo, quando vista através da lente da terapia narrativa e da externalização do problema, desdobra-se como uma narrativa onde o alcoolismo não é uma característica intrínseca do indivíduo, uma falha moral ou de caráter, mas sim um intruso externo com o qual a pessoa se depara. Nessa história, o alcoolismo é personificado como um antagonista astuto, um desafiador persistente que se infiltra nas rotinas, nos pensamentos e nas relações, alterando a paisagem da vida cotidiana. Para quem enfrenta esse antagonista, a luta não é apenas contra um hábito ou uma dependência, mas contra uma força externa que parece ter sua própria vontade e que impõe à vida das pessoas seus desejos. Essa personificação do alcoolismo permite uma distância crítica e psicológica do problema, ajudando a ver que o 'eu' e o 'alcoolismo' são entidades separadas. Esta abordagem oferece uma mudança de perspectiva, transformando o enfrentamento ao vício em um confronto com um inimigo externo. Nessa narrativa, cada recaída, cada tentação resistida, e cada dia de sobriedade ganha novo significado. Não são mais vistos como falhas ou sucessos pessoais, mas como eventos em um campo de batalha mais amplo. As recaídas são estratégias astutas do adversário, enquanto a resistência e a sobriedade são vitórias contra ele. Este ponto de vista ajuda a aliviar a culpa e a vergonha que muitas vezes acompanham o alcoolismo, pois o indivíduo pode se reconhecer como um lutador corajoso contra um inimigo formidável, em vez de alguém definido ou derrotado pelo problema. Nessa luta, o apoio de amigos, familiares e profissionais é como um exército aliado. Eles não estão lá para julgar ou repreender, mas para fornecer estratégias, conforto e um lembrete do mundo além do alcance do alcoolismo. Neste contexto, terapeutas atuam com as pessoas como táticos e estrategistas, ajudando a mapear o terreno, compreender as estratégias do adversário para planejar formas de enfrentamento e resistência. Além disso, a externalização do alcoolismo permite uma visão mais otimista e esperançosa. Se o alcoolismo é um inimigo externo, então há a possibilidade de vitória, de trégua, de redefinir o território da própria vida. O indivíduo pode começar a vislumbrar um futuro onde ele vive livre desse adversário, não por negar sua existência, mas por reconhecer sua separação dele. Essa jornada não é simples nem linear. É uma luta contínua, repleta de altos e baixos, avanços e recuos. No entanto, ao tratar o alcoolismo como um problema externo, cria-se um espaço para a compaixão, a resiliência e, acima de tudo, a esperança de que, apesar dos desafios e das dificuldades, o indivíduo tem a força e o apoio para reivindicar sua vida de volta das garras desse inimigo astuto. Escrito por Cristina Ruffino, na Série Externalização #2. A externalização do problema no contexto do vício digital é uma forma de reenquadrar a situação de uma forma em que a pessoa que convive com o problema se torne mais potente frente a ele. O vício digital não é visto como uma falha interna da pessoa, mas como um desafio externo, algo que está ali, separado dela. É como se o vício fosse um personagem próprio, um elemento intrusivo que entra na vida da pessoa sem ser convidado e interfere desastrosamente na vida da pessoa.
Essa maneira de ver as coisas traz uma mudança de perspectiva importante. Em vez de se identificar como "viciado", o indivíduo começa a ver o vício como algo danoso frente ao qual resiste. Isso pode ser incrivelmente libertador. Afinal, se o vício é visto como externo, ele não define a pessoa. Ele é apenas um obstáculo a ser superado, não uma característica da própria identidade ou caráter da pessoa. Ao externalizar o problema, a pessoa pode começar a pensar em estratégias para enfrentá-lo, como se estivesse elaborando um plano para conhecer melhor um adversário e conseguir não se deixar levar pelas suas seduções. Pode fazer parte deste plano: limitar o uso de dispositivos digitais, buscar atividades alternativas que preencham o tempo de forma mais saudável ou até mesmo procurar apoio profissional. A família tem um papel importantíssimo de resistência ao problema junto com a pessoa. Se entendermos que o Vício é um agente que convence a pessoa a se manter isolado no quarto escuro, a família pode atuar no sentido de ser aquela que não entra nas "artimanhas" do Vício e abre as janelas, chama para fora do quarto, propõe alternativas que minem o poder do Vício sobre a pessoa. O mais importante é que esse reenquadramento oferece esperança e empoderamento. Em vez de se sentir derrotado pelo vício, a pessoa se vê como alguém que está enfrentando um desafio difícil, mas superável. Isso enfatiza a força e a resiliência, ao invés da vulnerabilidade e da fraqueza. Afinal, se o problema é externo, então ele pode ser confrontado, controlado e, eventualmente, vencido. Escrito por Cristina Ruffino, na Série Externalização #1. "O problema é o problema, a pessoa não é o problema" - esse é o olhar transformador que a terapia narrativa nos convida a ter frente às questões que as pessoas enfrentam. Mais do que uma teoria, entendo que é uma epistemologia a partir da qual conhecemos as pessoas e seus desafios.
Essa ideia é uma abordagem revolucionária na terapia e na compreensão dos desafios psicológicos. Esse recurso baseia-se na ideia de que os problemas podem ser vistos como entidades separadas das pessoas que os enfrentam. Essa separação cria um espaço vital para a compreensão e a mudança. Esta visão contrasta com muitas abordagens tradicionais da psicologia, onde os problemas são frequentemente vistos como parte integrante da identidade de um indivíduo. Para a terapia narrativa, essa identificação com os problemas pode ser limitante e prejudicial, pois leva a sentimentos de impotência e fracasso para a pessoa e sua família. Ao externalizar o problema, este deixa de ser uma característica inerente ao indivíduo e passa a ser algo que ele está enfrentando ou com o qual está interagindo. Por exemplo, em vez de uma pessoa se ver como "depressiva", ela é convidada a ver a depressão como um desafio externo que está impactando sua vida. Isso permite que as pessoas se distanciem de seus problemas, observando-os de uma nova perspectiva e reduzindo a tendência de se culpar ou se sentir envergonhadas por eles. Essa abordagem também encoraja as pessoas a reescreverem suas histórias. Em vez de serem definidas pelo problema, elas podem começar a ver-se como protagonistas em uma jornada para superar um obstáculo externo. Isso pode ser incrivelmente capacitador e pode abrir caminho para soluções criativas e inovadoras para os desafios que enfrentam. Além disso, a externalização facilita a colaboração e o apoio de outras pessoas. Quando um problema é visto como externo, amigos, familiares e terapeutas podem se unir à pessoa no enfrentamento a este desafio comum, em vez de tentar "consertar" a pessoa. Na minha prática, sinto que investigar junto com os clientes suas questões a partir desta lente os coloca em um papel mais esperançoso e ativo. Ela não só ajuda as pessoas a verem seus desafios sob uma luz diferente, mas também promove uma sensação de esperança, agência e possibilidade de mudança. Ao separar as pessoas dos problemas que enfrentam, White ofereceu um caminho para a recuperação e o empoderamento que tem influenciado profundamente a prática terapêutica moderna. Escrito por Cristina Ruffino A terapia dialógica é uma abordagem terapêutica que enfatiza o diálogo como meio central de engajamento e transformação. Ela se baseia na ideia de que a linguagem e a conversa não são apenas ferramentas para descrever a realidade, mas também meios pelos quais construímos e co-criamos nossa realidade.
Ao contrário de abordagens terapêuticas que podem se concentrar em técnicas específicas ou interpretações do terapeuta, a terapia dialógica coloca o diálogo no centro do processo terapêutico. O diálogo é visto como um espaço onde terapeuta e cliente co-construem significados e exploram novas perspectivas. Entendendo que novos significados podem produzir novas emoções e posicionamentos. A terapia dialógica opera sob a premissa de que a realidade é co-construída através da linguagem. Isso significa que as narrativas e histórias que contamos sobre nós mesmos e nossas vidas não são fixas, mas podem ser reformuladas e recontadas através do diálogo. Cada narrativa destaca determinados eventos e obscurece outros, e é justamente na dança de figura e fundo que a conversa estimula nas nossas narrativas que produzimos mudanças. Ao explorar e recontar histórias, ao questionar e redefinir narrativas, os clientes podem encontrar novas maneiras de entender e se relacionar com suas experiências. Tanto o terapeuta quanto o cliente são encorajados a adotar uma postura reflexiva. Isso significa que eles estão constantemente refletindo sobre o que está sendo dito, como está sendo dito e o impacto dessas palavras. Também prestamos atenção ao que é “dito” com os silêncios, hesitações, gestos e movimentos. A terapia dialógica vê a relação terapeuta-cliente como uma parceria colaborativa. Ambos são vistos como especialistas - o cliente é o especialista em sua própria vida e experiências, enquanto o terapeuta traz conhecimento e habilidades terapêuticas. É o cliente quem informa ao terapeuta sobre a versão de si na qual se sente mais integrado e pleno. As principais influências teóricas à terapia dialógica é Bakhtin sobre dialogismo, bem como abordagens pós-estruturalistas e construcionistas sociais da linguagem e da realidade. |
Cristina RuffinoSou Pedagoga (Unicamp), Mestre em Psicologia (Unicamp), doutora em Psicologia pela USP-RP. Arquivos
Dezembro 2024
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