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Por Cristina Ruffino. Observando e, muitas vezes, me angustiando com o que estamos assistindo no Brasil e no mundo em termos dos desarranjos climáticos, me deparei com leituras de Levinas, filósofo do período pós-Segunda Guerra. Derrida questionou as ideias de Levinas e as desconstruiu de uma forma que me encanta, mas descubro agora que as ideias de Levinas me fazem bem neste momento e me convidam a operar para além da angústia. Isso porque o autor coloca a responsabilidade no centro de sua ética, atribuindo-lhe um papel fundamental na relação com o Outro. Para ele, a responsabilidade é uma resposta direta e inescapável à presença do outro ser humano. A mera presença do outro nos interpela e exige uma resposta ética.
Desde o nascimento, o ser humano está imerso em um mundo de relações e, desde cedo, aprende a reconhecer a presença dos outros. Ainda que a responsabilidade, no sentido pleno, não seja algo consciente em bebês ou crianças pequenas, a capacidade de perceber o Outro e responder a essa alteridade começa a se desenvolver nas primeiras interações sociais, como com os pais, cuidadores e pessoas próximas. Outro dia, durante uma supervisão de Diálogos Abertos, ouvindo os colegas, essas ideias me convidaram à reflexão, naquele momento, endereçada ao contexto terapêutico: a responsabilidade do terapeuta frente ao que escuta de cada pessoa, de cada membro da família presente, daqueles que não estão presentes e dos co-terapeutas. Para esse filósofo, a responsabilidade é anterior à liberdade. A responsabilidade para com o Outro não é algo escolhido livremente; ao contrário, ela antecede qualquer escolha ou decisão. Estamos sempre já responsáveis antes mesmo de nos darmos conta, porque o Outro nos interpela simplesmente por existir. Eu costumava pensar que não temos o livre arbítrio de não nos comunicarmos com um outro humano presente: quer escolhamos falar ou calar, levantar ou abaixar o olhar, a comunicação foi feita. Ao ler Levinas, percebo que ali já operou a responsabilidade que, segundo ele, também não é uma escolha. Enquanto penso que escolho, a ação já foi feita e sou responsável por suas consequências. A responsabilidade que temos em relação ao Outro é, segundo ele, infinita e assimétrica. Isso significa que nunca podemos "pagar" ou "quitar" essa responsabilidade, ela está sempre além do que podemos fazer. Além disso, essa responsabilidade não é recíproca; não posso exigir que o Outro seja responsável por mim da mesma forma. Quando Levinas se refere a "face" do Outro, não se refere ao aspecto físico, mas ao que simboliza a vulnerabilidade e a alteridade do outro ser humano. A face do Outro, ao me confrontar, impõe-me a responsabilidade. No contexto terapêutico, a “face” do outro nos diz, sem palavras: "me cuide", e este é o chamamento ético que me proíbe de objetificar ou ignorar o Outro. Não é só o Outro presente que se impõe, aqueles que presentificamos no diálogo também se impõem a nós. Embora a relação primordial de responsabilidade seja para com o Outro singular presente, também reconhece a necessidade de justiça quando aparece um "terceiro", ou seja, quando existem múltiplos Outros. A justiça surge como a necessidade de equilibrar a responsabilidade que temos para com cada ser humano, sem que isso diminua a singularidade da relação ética com o Outro. Nas conversas terapêuticas em que um Outro nos fala de tantos Outros, como acolhemos este Outro presente sem ignorarmos que nossa responsabilidade se estende até tantos Outros que existe em cada história? Vejam que intrigante: para Levinas, a subjetividade – aquilo que penso que me constitui – também se constitui precisamente na responsabilidade pelo Outro. Eu sou, enquanto sujeito, na medida em que sou responsável. Assim, para ele, a ética não é um complemento à vida humana, mas sua própria fundação!! Depois vem Derida, desmonta tudo isso e remonta convidando a outras tantas reflexões… Enfim, o pensamento está sempre em transformação e isso me instiga a observar os efeitos que cada uma destas ideias, pensadas como metáforas, produzem em mim e que ações convidam. Por Cristina Ruffino. Você já notou como o humor do seu parceiro pode afetar o seu dia? Ou como um gesto de carinho num momento de estresse pode acalmar os ânimos? Esses são exemplos do que chamamos de "corregulação" no casal.
O que é corregulação? Corregulação é um processo em que duas pessoas, nesse caso, os parceiros em um relacionamento, se ajudam mutuamente a lidar com seus estados emocionais. É um "cuidar do bem-estar" em conjunto. Quando você percebe que seu parceiro está preocupado e tenta acalmá-lo, ou quando ele retribui seu gesto de afeto depois de um dia difícil, isso é corregulação em ação. A identificação do fenômeno da corregulação entre humanos é tratada por diversas perspectivas da psicologia e vem sendo corroborada por achados da neurofisiológicos e bioquímica da conexão mente-corpo. Nossa necessidade de corregulação vem do fato de que, como seres humanos, estamos programados para buscar segurança e conforto nos relacionamentos. Quando você se sente seguro ao lado do seu parceiro, seu corpo e sua mente entram em um estado de relaxamento, promovendo bem-estar e proximidade. Como acontece a corregulação? Para que a corregulação aconteça, ambos os parceiros precisam estar presentes e abertos a participar desse processo. Não é algo que um faz sozinho; é uma colaboração. Vamos a um exemplo prático: Imagine que você teve um dia péssimo no trabalho e, ao chegar em casa, está irritado e fechado. Seu parceiro, percebendo isso, te acolhe, te escuta e evita críticas. Essa resposta ajuda a acalmar seu sistema nervoso e diminui seu estresse. É nesse tipo de interação que a corregulação aparece no dia a dia do casal. Dicas para melhorar a corregulação no relacionamento: 1. Comunicação clara e empática: Praticar a expressão das emoções e vulnerabilidades ajuda o parceiro a compreender o que você está sentindo. Por exemplo, ao invés de dizer "Você nunca me escuta!", experimente: "Eu me sinto ignorado quando não consigo expressar o que estou sentindo." Da mesma forma, responder com empatia e atenção reforça a conexão emocional. 2. Reconhecer e reparar rupturas: Momentos de conflito ou desentendimento fazem parte de qualquer relacionamento. A chave é como o casal lida com isso. Em vez de se afastar ou continuar a discussão, tente um gesto de reconciliação, como um pedido de desculpas ou um abraço. Isso ajuda a reparar a conexão emocional. 3. Autorregulação é essencial: É importante que cada um no casal consiga lidar com suas próprias emoções. Quando um parceiro depende exclusivamente do outro para se equilibrar, isso pode gerar sobrecarga. Aprender a se acalmar antes de reagir impulsivamente permite que ambos se apoiem mutuamente de forma saudável. 4. Identificar gatilhos: Cada casal tem seus próprios "pontos sensíveis", como críticas, falta de tempo juntos ou estresse. Reconhecer esses gatilhos permite abordá-los de maneira mais cuidadosa. 5. Escuta ativa: Durante os desentendimentos, é comum querer se defender ou justificar. No entanto, ouvir genuinamente o que o outro está sentindo, sem interromper, é crucial para que ambos se sintam compreendidos. Esse simples gesto pode transformar a forma como os conflitos são resolvidos. 6. Flexibilidade e adaptação: Estar disposto a adaptar seus pontos de vista e considerar novas ideias facilita a resolução de conflitos. Flexibilidade emocional é um grande aliado na corregulação, pois abre espaço para encontrar soluções criativas e construir um relacionamento mais resiliente. Transformando rupturas em conexão Conflitos vão acontecer – é inevitável. Mas a forma como você e seu parceiro se reconectam após uma briga pode fortalecer ainda mais o relacionamento. Admitir medos e inseguranças, e permitir-se ser vulnerável, cria um ambiente de confiança e intimidade. Portanto, a corregulação no casal não é sobre evitar os momentos de tensão, mas sim sobre como vocês se apoiam e crescem juntos. Como diz o terapeuta John Gottman, o sucesso de um relacionamento não está na ausência de conflitos, mas em como o casal se reconecta e aprende após cada desafio. Por Cristina Ruffino. No livro “New Horizons in Buddhist Psychology” publicado pelo TAOS Institute, James Austin assina o capítulo “Meditating Selflessly”(meditando altruisticamente), onde articula uma visão integrada que conecta as práticas meditativas tradicionais do budismo com as descobertas contemporâneas da neurociência. O autor discute como a meditação tem a capacidade de desconstruir a noção do "eu", que geralmente é entendido como uma entidade fixa, separada e individual. Essa desconstrução não significa uma aniquilação, mas sim uma alteração na maneira como percebemos nossa identidade. Durante a meditação profunda, a sensação de um "eu" sólido começa a se desfazer, dando lugar a uma experiência de fluidez entre o sujeito e o ambiente.
Na tradição budista, o conceito de anatta (não-eu) é central. Austin explora como, na meditação, os praticantes começam a perceber que o "eu" é construído por pensamentos, memórias e experiências que estão constantemente mudando. A prática meditativa, ao acalmar a mente, permite uma visão direta de que o "eu" é impermanente e interdependente com o mundo ao redor. No exercício da meditação, gradualmente ocorre uma mudança na percepção. O foco da atenção pode se expandir além dos limites do corpo e da mente individuais, permitindo que o meditador se sinta mais conectado com o todo, em vez de confinado a uma identidade limitada e separada. James Austin utiliza a neurociência para explorar como a meditação pode alterar de forma duradoura o cérebro, um fenômeno conhecido como neuroplasticidade. Ele discute como a prática contínua de mindfulness pode modificar as conexões sinápticas no cérebro, promovendo mudanças nas áreas associadas à atenção, compaixão e autorregulação emocional. Estudos mostram que, com a prática regular, áreas do cérebro relacionadas à atenção e à regulação emocional, como o córtex pré-frontal, se tornam mais ativas e mais espessas. Isso pode levar a uma maior capacidade de concentração e uma redução na reatividade emocional. Há, ainda, uma diminuição da atividade no que é chamado de "eu narrativo", ou seja, a constante atividade mental que cria e sustenta a sensação de um "eu" ao contar histórias sobre si mesmo. O "eu experiencial", que está mais ligado à percepção direta e ao momento presente, passa a se destacar. Um dos efeitos do mindfulness é que “desliga” ou reduz a atividade da chamada Rede de Modo Padrão, que é a rede cerebral que está ativa quando não realizamos uma atividade específica. Quando esta rede está ativa, ela produz ruminação, os pensamentos autorreferenciais, e as preocupações com o passado e o futuro. A prática meditativa, ao trazer o foco para o presente, reduz essa ativação, resultando em menos pensamentos autocentrados e em mais presença no momento. Também contribui para experiências de "não dualidade", nas quais a pessoa percebe uma dissolução das fronteiras entre o eu e o ambiente. Levando a uma sensação de paz interior e um enfraquecimento do sentimento de separação entre o "eu" e o mundo exterior. Austin sugere que essas experiências podem estar ligadas a mudanças temporárias nas redes neurais que normalmente sustentam o senso de identidade. Ao meditar profundamente, os praticantes podem experienciar a desconstrução do "eu" e mudanças significativas na plasticidade cerebral. Qual sua experiência com mindfulness? O que já experimentou nesta prática? Por Cristina Ruffino. O dilema apresentado por Aldous Huxley em seu clássico "Admirável Mundo Novo", escrito em 1932, é a possibilidade de um mundo onde a felicidade é garantida, onde não há conflitos, doenças ou ansiedade, mas, o preço dessa "perfeição" é a liberdade e a individualidade, ou seja, a nossa essência humana.
Na sociedade retratada por Huxley, o controle não vem pela força, mas pela sedução do conforto e da estabilidade. As pessoas são "fabricadas" para serem felizes em suas funções pré-determinadas. A droga "soma" elimina qualquer desconforto emocional. Isso parece ser um espelho perturbador da nossa era atual. Vejamos no que isso se parece com a realidade norte americana em que um em cada cinco americanos, incluindo crianças, estão tomando algum medicamento psiquiátrico prescrito? Estas drogas certamente fornecem alívio eficaz no curto prazo, mas as consequências a longo prazo não são suficientemente discutidas – vide o documentário jornalístico “Medicando o Normal”. Perguntemo-nos: essa felicidade artificial tem valor? O que perdemos quando eliminamos toda possibilidade de sofrimento? Quantas vezes buscamos soluções rápidas para nossos problemas emocionais? Quantas vezes nos perdemos em distrações digitais para evitar enfrentar nossos próprios pensamentos? Estamos, de certa forma, criando nossa própria versão do "soma"? Huxley nos provoca questionando: o que realmente significa ser livre? Será que a liberdade não está justamente na possibilidade de errar, de sofrer, de questionar? Em um mundo onde tudo é controlado e previsível, o que resta da aventura de Ser humano? Pensando na minha própria vida… as experiências que mais me fizeram crescer não foram as mais prazerosas. Muitas delas envolveram desafios, dúvidas, angústia e dor. Se eu pudesse eliminar todos esses momentos difíceis, seria realmente o que sou? No "admirável" mundo de Huxley, consumir não é apenas um hábito, é um dever moral. As pessoas são condicionadas a sempre buscar o novo, a nunca se satisfazer com o que têm. Soa familiar para você? A sociedade de Huxley usa a tecnologia para controlar todos os aspectos da vida humana, desde a genética até as emoções. Hoje, agora, também vivemos em um mundo cada vez mais mediado pela tecnologia. Ela nos conecta, nos informa, nos entretém, molda nossa rotina, nossas relações, nossos pensamentos. Em última análise, "Admirável Mundo Novo" nos convida a refletir sobre o que significa ser autenticamente humano. Em um mundo que constantemente nos empurra para a conformidade, como podemos preservar nossa individualidade? Como equilibrar o desejo por conforto e estabilidade com a necessidade de crescimento e autenticidade? Estas não são perguntas fáceis, mas são essenciais. À medida que nossa sociedade avança tecnologicamente, torna-se cada vez mais crucial que nos perguntemos: que tipo de mundo estamos construindo? Que aspectos da nossa humanidade são inegociáveis, mesmo diante da promessa de uma vida sem conflitos? Qual a responsabilidade de cada um de nós frente a isso? "Admirável Mundo Novo" não é apenas uma obra de ficção científica. É um convite para olharmos criticamente para nossas escolhas, nossas sociedades e nosso futuro. É muito mais do que uma crítica ao totalitarismo ou uma previsão tecnológica. É um alerta atemporal e um convite à reflexão sobre o que nos torna verdadeiramente humanos e sobre os perigos de uma sociedade que, ao evitar todo tipo de conflito e sofrimento, também elimina a profundidade da experiência humana. Por Cristina Ruffino. No livro New Horizons in Buddhist Psychology , publicado pelo Instituto TAOS, Paul Fleischman assina o capítulo "Beyond Mindfulness: Complex Psychological Development Through Vipassana", onde ele explora os profundos impactos psicológicos da prática de meditação Vipassana. Fleischman vai além da visão popular do mindfulness, muitas vezes tratada como uma técnica simples de bem-estar, para abordar a complexidade do desenvolvimento psicológico promovido pela prática avançada de Vipassana.
Segundo ele, enquanto o mindfulness se concentra principalmente na observação do momento presente sem julgamento, a Vipassana oferece um caminho muito mais profundo e transformador para o desenvolvimento psicológico. Ao explorar a desconstrução do ego, o desenvolvimento da sabedoria (panna) e a transformação pessoal, pode gerar mudanças significativas na maneira como o praticante se relaciona com suas próprias experiências internas. Embora o mindfulness seja um componente importante da meditação, Vipassana vai além da simples observação da mente, se aprofunda na compreensão das causas do sofrimento humano e nos padrões mentais prejudiciais que nos aprisionam. A prática de Vipassana busca cultivar uma sabedoria penetrante sobre três características fundamentais da realidade: a impermanência (anicca), o sofrimento inerente (dukkha) e a ausência de um "eu" fixo (anatta). Fleischman enfatiza que a prática de Vipassana envolve várias etapas que levam ao desenvolvimento psicológico gradual e profundo. O praticante é incentivado a observar suas experiências internas de forma progressivamente mais penetrante, o que pode resultar em transformações psicológicas complexas. Isso inclui a reestruturação de padrões de pensamento e a criação de uma nova relação com o sofrimento, baseada na aceitação da interdependência e da impermanência de todas as coisas. O praticante, na medida em que identifica o apego ao ego, pode desenvolver uma compreensão libertadora de que o "eu" é uma construção fluida e impermanente. Esse insight profundo permite que eles se libertem dos apegos e identidades rígidas que são frequentemente fontes de sofrimento. A prática de Vipassana exige um compromisso profundo e de longo prazo. Ela vai muito além de uma técnica para alívio do estresse ou regulação emocional. Em vez disso, é um caminho para o crescimento psicológico e espiritual, proporcionando uma mudança duradoura e significativa no modo como se vive e se percebe o mundo. Fleischman também sugere que a prática de Vipassana oferece uma base sólida para tratar várias formas de sofrimento psicológico. Ao abordar diretamente as raízes do sofrimento humano, a prática pode ser uma ferramenta poderosa para enfrentar problemas emocionais e comportamentais, como apego, raiva, ansiedade e depressão. No entanto, ele adverte que Vipassana requer paciência e dedicação, e seus benefícios vão além do alívio imediato dos sintomas. Um excelente exemplo do impacto transformador de Vipassana pode ser visto no documentário indiano "Doing Time, Doing Vipassana", lançado em 1997. O filme mostra o projeto que introduziu a prática de Vipassana no presídio de Tihar, um dos maiores da Índia, sob a liderança de Kiran Bedi, ex-diretora da prisão. O documentário ilustra como a prática ajudou muitos prisioneiros a transformar suas vidas, lidando com a raiva e o arrependimento através da meditação. Link do vídeo https://youtu.be/WkxSyv5R1sg?si=sKXrcpYMRLiZ31C4 Para começar a praticar Vipassana , o primeiro passo é o cultivo da concentração por meio da observação da respiração (Anapana), uma prática semelhante ao mindfulness. Em seguida, o praticante passa à observação imparcial das sensações corporais com equanimidade, uma prática essencial em Vipassana. Com o tempo e a prática regular, o praticante desenvolve o insight necessário para compreender a verdadeira natureza da realidade, resultando em uma mente equilibrada, menos reativa e mais sábia. Você se sente motivado? Se sim, o que te atrai nesta prática? Como as Telas Afetam o Desenvolvimento das Crianças e a Importância da Leitura. Por Cristina Ruffino. Vivemos em uma era em que as telas estão por toda parte nas nossas vidas. Celulares, tablets, computadores e televisões se tornaram parte das nossas rotinas, inclusive das crianças. No entanto, Michel Desmurget, neurocientista e autor dos livros "A Fábrica de Cretinos Digitais" e "Faça-os Ler", nos alerta sobre os riscos que o excesso de exposição digital pode ter no desenvolvimento dos jovens.
Desmurget argumenta que o uso diário de dispositivos digitais está comprometendo o desenvolvimento cognitivo, emocional e social das crianças. Mas por que isso acontece? O problema não é apenas o que as crianças consomem nas telas, mas o que elas deixam de fazer por estarem tão imersas nesse mundo digital. Quando uma criança passa horas na frente de uma tela, ela perde oportunidades preciosas de desenvolver habilidades fundamentais. Ela deixa de brincar, de explorar o mundo ao seu redor, de interagir com outras pessoas e, especialmente, de ler. Segundo Desmurget, essa falta de experiências ricas pode afetar drasticamente o desenvolvimento da linguagem, a capacidade de atenção, o pensamento crítico e a empatia. Uma das coisas que as crianças deixam de fazer é ler. Incrível, pois a escrita foi uma das maiores conquistas da nossa espécie, nos deu possibilidades incríveis de irmos para além de nós mesmos, vivermos vidas para além das nossas, vivermos tempos além do nosso tempo. A leitura é uma das atividades mais poderosas para o desenvolvimento cognitivo e emocional das crianças. A leitura ajuda a expandir o vocabulário, estimula a imaginação e a criatividade e desenvolve a empatia, ao permitir que as crianças entrem em contato com diferentes perspectivas e sentimentos. Mas como fazer as crianças se interessarem pela leitura em um mundo dominado pelas telas? É aqui que entra o papel dos pais e educadores na criação de um ambiente propício à leitura. Desmurget nos lembra que as crianças são influenciadas pelo exemplo. Pais que leem com frequência e que promovem momentos de leitura em casa ajudam a criar uma atmosfera onde os livros são valorizados. Não é fácil competir com a infinidade de estímulos que as telas oferecem. Desenhos coloridos, jogos interativos e vídeos rápidos prendem a atenção das crianças de forma quase hipnótica. No entanto, é essencial entender que a leitura oferece um tipo de estímulo diferente – um que nutre a mente e as emoções a longo prazo. Desmurget enfatiza que não é necessário proibir completamente o uso das telas, mas sim estabelecer limites e incentivar ativamente a leitura. Crianças pequenas, por exemplo, precisam de livros adequados à sua faixa etária, com histórias envolventes e ilustrações que despertem a curiosidade. Conforme crescem, é importante oferecer opções variadas que atendam aos interesses de cada criança, seja aventura, fantasia, mistério ou fatos da vida real. Para incentivar a leitura em casa podemos: 1. Estabelecer uma rotina de leitura que se estabelece com a leitura regular Leia para seus filhos, mesmo que eles já saibam ler. Crie um momento especial do dia para isso, seja antes de dormir ou após as refeições. Esses momentos se tornarão hábitos que as crianças levarão para a vida adulta. 2. Seja exemplo para elas, envolva-se com leituras que possam ir além de posts e matérias resumidas As crianças aprendem observando os adultos. Quando veem seus pais e familiares lendo, seja um livro, revista ou jornal, elas aprendem que a leitura é uma atividade valiosa e um lazer. 3. Tornando a leitura divertida Escolha livros com histórias cativantes e personagens interessantes. Use diferentes tons de voz e faça expressões faciais enquanto lê para tornar a experiência ainda mais envolvente. 4. Leve a leitura para o cotidiano Fale sobre as histórias lidas, relacione-as com situações do dia a dia e encoraje as crianças a contarem suas próprias versões das histórias. 5. Crie um ambiente propício Tenha livros acessíveis em casa. Uma estante ou prateleira ao alcance das crianças faz com que elas se sintam à vontade para explorar e escolher o que desejam ler. 6. Limite o tempo de tela Não é sobre proibir, mas sim regular. Regular o tempo e o que se faz nas telas é função dos adultos. Estabeleça horários específicos para o uso de telas e sempre ofereça alternativas, como brincar ao ar livre, desenhar ou ler um livro. A comunidade também tem um papel fundamental na promoção da leitura, de um contexto onde as pessoas se interessam por livros e leituras, nascerão leitores. A leitura não deve ser vista como uma tarefa chata ou obrigatória, mas como uma atividade que pode ser divertida e transformadora. Organizar clubes de leitura, compartilhar histórias e experiências com outros pais e crianças e criar espaços dedicados aos livros são formas de construir uma cultura de leitura que transcenda os limites da casa. Em um mundo cada vez mais digital, fazer escolhas conscientes para o bem-estar e desenvolvimento das crianças é uma tarefa nossa. Como estamos moldando o futuro dos nossos filhos e das próximas gerações? As telas têm o seu lugar, mas a leitura é insubstituível quando se trata de cultivar mentes curiosas, críticas e empáticas. Afinal, ler é muito mais do que decifrar palavras; é descobrir novos mundos e compreender o nosso próprio. Em última instância, me fica a máxima: atenção plena a cada escolha que fazemos (ou não fazemos) para as nossas vidas e dos nossos filhos. Por Cristina Ruffino. John Shotter sempre me provoca e desafia. Admito que talvez ainda não o tenha compreendido em toda sua profundidade. Mas, ainda assim, usufruo de cada instante de leitura e uso na vida, no trabalho, no meu autoconhecimento.
Para esse autor, a comunicação transcende a mera troca de informações, enraizando-se profundamente em nossa existência corpórea, emocional e prática. Nossos corpos não são meros veículos de comunicação, mas elementos constitutivos da própria interação. A linguagem e o sentido emergem não apenas das palavras, mas de um engajamento corporal holístico: gestos e expressões faciais; tom de voz e prosódia; postura e movimentos corporais; contato visual e proximidade física A relação dialógica ocorre em um espaço intersubjetivo onde os corpos dos participantes se encontram. Este encontro vai além do cognitivo ou linguístico, criando uma experiência profundamente corporal e situada. Como uma dança, a construção de entendimentos, envolve uma sensibilidade e “escuta” mútua de corpos. Shotter enfatiza a importância de uma sensibilidade aguçada aos sinais corporais e emocionais dos outros. Esta "escuta" atenta de si e do outro é fundamental para: compreensão mútua, construção conjunta de significado e, sobretudo, a criação de "momentos de encontro" As respostas corporais dos interlocutores são parte integral do processo de coconstrução de significado. Reações não verbais, como expressões faciais, movimentos e ritmo da fala, contribuem significativamente para o diálogo. Para além das palavras, elementos paralinguísticos desempenham um papel crucial na comunicação, envolvendo as pausas e silêncios, o ritmo respiratório e o tom de voz. Estes elementos indicam emoções, intenções e o nível de envolvimento na conversa, facilitando a fluidez do diálogo e a construção conjunta de compreensões. Shotter introduz a noção de "conhecimento de dentro" (knowing from within), uma forma de compreensão que emerge da participação direta em práticas sociais e conversacionais. A prosódia, neste contexto, é vista como um fenômeno relacional entre os participantes e parte do “backgraund” que dá sentido às nossas interações, além de ser um elemento fundamental da "responsividade" nas interações Quando leio as ideias de Shotter, destaca-se para mim (em mim) a primazia da afetação nas relações. Primeiro nos afetamos mutuamente a partir de sinais não conscientes (não discerníveis e identificáveis), depois, buscamos explicações cognitivas para estas afetações. Frequentemente, nossas respostas "cognitivas" são tentativas de racionalizar o que não se originou na lógica, mas na experiência corporal e emocional. A compreensão destes aspectos da comunicação tem implicações significativas para diversos campos como terapia, educação, comunicação organizacional. Enfatiza-se a importância de estar atento não apenas ao conteúdo verbal, mas também à forma como é expresso. A visão de Shotter sobre a corporeidade na relação dialógica nos convida a reconsiderar fundamentalmente nossa compreensão da comunicação humana. Reconhecendo o papel central do corpo e dos elementos não verbais, podemos desenvolver interações mais ricas, autênticas e significativas em todos os aspectos de nossas vidas. Por Cristina Ruffino. Há algum tempo, tenho me dedicado a entender as ideias apresentadas no livro de Maurits Kwee, editado pela TAOS Institute e prefaciado por Kenneth Gergen. Esta obra, juntamente com "Horizons in Buddhist Psychology", de co-autoria de Kwee e Gergen, tem sido uma fonte rica de insights e novas curiosidades para meus estudos.
Neste livro, Kwee apresenta uma integração inovadora entre a psicologia ocidental contemporânea e as tradições budistas milenares, com um foco especial em práticas colaborativas e relacionais. O resultado é uma abordagem que não apenas expande nossa compreensão da mente humana, mas também oferece novas ferramentas para o bem-estar psicológico. Ele apresenta o "Budismo Relacional", que é uma abordagem que enfatiza as relações intersubjetivas e a interdependência de todos os fenômenos. Esta perspectiva incorpora ideias profundas de interconexão e coemergência de experiências e identidades, alinhando-se com o construcionismo social e a natureza relacional da realidade. Um conceito muito interessante é o de "coemergência" - a ideia de que os fenômenos surgem mutuamente em um contexto relacional. Este conceito oferece uma nova lente para compreender os processos de autorregulação e corregulação emocional, abrindo caminho para abordagens mais holísticas no tratamento de questões psicológicas. A consciência plena (mindfulness) emerge como uma prática fundamental neste contexto, oferecendo ferramentas poderosas para navegar a complexidade de nossas experiências emocionais e relacionais. Kwee introduz a fascinante ideia do "não-eu" (anatta) no contexto da psicologia moderna. Ao desconstruir a noção de um eu fixo e imutável, esta abordagem oferece um caminho para reduzir o sofrimento psicológico. Compreender o "eu" como uma construção mental, moldada por contextos temporais e geográficos, pode liberar os indivíduos de padrões rígidos de pensamento e comportamento. Integrando estas ideias, Kwee propõe um modelo de terapia dialógica e colaborativa. Nesta abordagem, terapeuta e cliente trabalham juntos em um processo cocriativo de mudança, respeitando a natureza intersubjetiva da experiência humana. Esta metodologia se mostra particularmente eficaz no tratamento de questões existenciais e no alívio do sofrimento psicológico. O livro também explora as conexões entre práticas meditativas budistas e descobertas recentes da neurociência. Kwee examina como a meditação pode alterar a estrutura e a função cerebral, impactando diretamente nossas capacidades de auto e corregulação. Estas práticas não apenas oferecem caminhos para a redução do sofrimento, mas também abrem portas para um aumento significativo do bem-estar geral. Este livro representa uma ponte entre a sabedoria antiga do Oriente e os avanços científicos do Ocidente, oferecendo insights valiosos para profissionais da saúde mental, pesquisadores e qualquer pessoa interessada em explorar as profundezas da consciência humana e do bem-estar psicológico. Estes temas te interessam? Quais destes conceitos mais te intriga? Topa continuar a conversar sobre eles? Por Cristina Ruffino. A intimidade do casal propicia múltiplas situações de acolhimento e bem estar, no entanto, essa mesma intimidade pode construir (desavisadamente) um padrão de reações entre o casal que foi chamado de Ciclo de Vulnerabilidade (Scheinkman e Fishbane). A experiência subjetiva de cada um ao longo da vida possibilita a construção de habilidades, competências, recursos e, também, vulnerabilidades diferentes. Isso não é nem bom, nem mau. É a vida construindo pessoas únicas, onde cada um é especial. Vulnerabilidade é algo frente ao qual a pessoa tem uma maior possibilidade de se sentir afetad@ negativamente, acionando reações de defesa, luta, fuga e congelamento. Vulnerabilidade não é algo errado ou inadequado n@ outr@, algo a ser consertado. É o resultado de uma vivência ou vivências que criaram um padrão e que precisa ser conhecido para ser manejado E respeitado. Quando conhecemos nossas vulnerabilidades, não ficamos completamente à mercê das reações que elas disparam. Podemos perceber:
Assim, tomando contato com esse processo, podemos assumir o controle, monitorando nossos pensamentos e ações e pedindo ajuda para quem está ao nosso redor, entendendo-o como colaborador e não como o agressor. Neste ciclo, não tem uma vítima e um vilão, tem duas pessoas machucadas reagindo a algo que lhes parece ameaçador. Perceber, conhecer e nomear este padrão possibilita a mudança de conduta, a negociação e criação de narrativas baseadas na empatia e na conexão. Podendo mover o casal da: Quais são suas vulnerabilidades?
O que d@ outr@ dispara suas vulnerabilidades? Conhecendo isso, quais são seus pedidos ao outro? Leia mais em: Scheinkman e Fishbane. The Vulnerability Cycle: Working With Impasses in Couple Therapy. Family Process, Vol. 43, No. 3, 2004. Por Cristina Ruffino. A crônica de Rubem Alves, Tênis e Frescobol, é uma deliciosa metáfora para pensar relações humanas (casais, famílias, equipes, comunidade). A mim gera muitos insights a cada nova leitura, e para vc? Segue a crônica:
"Depois de muito meditar sobre o assunto concluí que os casamentos são de dois tipos: há os casamentos do tipo tênis e há os casamentos do tipo frescobol. Os casamentos do tipo tênis são uma fonte de raiva e ressentimentos e terminam sempre mal. Os casamentos do tipo frescobol são uma fonte de alegria e têm a chance de ter vida longa. Explico-me. Para começar, uma afirmação de Nietzsche, com a qual concordo inteiramente. Dizia ele: “Ao pensar sobre a possibilidade do casamento cada um deveria se fazer a seguinte pergunta: ‘Você crê que seria capaz de conversar com prazer com esta pessoa até a sua velhice?’ Tudo o mais no casamento é transitório, mas as relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar”. Xerazade sabia disso. Sabia que os casamentos baseados nos prazeres da cama são sempre decapitados pela manhã, terminam em separação, pois os prazeres do sexo se esgotam rapidamente, terminam na morte, como no filme O Império dos Sentidos. Por isso, quando o sexo já estava morto na cama, e o amor não mais se podia dizer através dele, ela o ressuscitava pela magia da palavra: começava uma longa conversa, conversa sem fim, que deveria durar mil e uma noites. O sultão se calava e escutava as suas palavras como se fossem música. A música dos sons ou da palavra – é a sexualidade sob a forma da eternidade: é o amor que ressuscita sempre, depois de morrer. Há os carinhos que se fazem com o corpo e há os carinhos que se fazem com as palavras. E contrariamente ao que pensam os amantes inexperientes, fazer carinho com as palavras não é ficar repetindo o tempo todo: ‘Eu te amo, eu te amo...’ Barthes advertia: “Passada a primeira confissão, ‘eu te amo’ não quer dizer mais nada”. É na conversa que o nosso verdadeiro corpo se mostra, não em sua nudez anatômica, mas em sua nudez poética. Recordo a sabedoria de Adélia Prado: “Erótica é a alma”. O tênis é um jogo feroz. O seu objetivo é derrotar o adversário. E a sua derrota se revela no seu erro: o outro foi incapaz de devolver a bola. Joga-se tênis para fazer o outro errar. O bom jogador é aquele que tem a exata noção do ponto fraco do seu adversário, e é justamente para aí que ele vai dirigir a sua cortada – palavra muito sugestiva, que indica o seu objetivo sádico, que é o de cortar, interromper, derrotar. O prazer do tênis se encontra, portanto, justamente no momento em que o jogo não pode mais continuar porque o adversário foi colocado fora de jogo. Termina sempre com a alegria de um e a tristeza de outro. O frescobol se parece muito com o tênis: dois jogadores, duas raquetes e uma bola. Só que, para o jogo ser bom, é preciso que nenhum dos dois perca. Se a bola veio meio torta, a gente sabe que não foi de propósito e faz o maior esforço do mundo para devolvê-la gostosa, no lugar certo, para que o outro possa pegá-la. Não existe adversário porque não há ninguém a ser derrotado. Aqui ou os dois ganham ou ninguém ganha. E ninguém fica feliz quando o outro erra – pois o que se deseja é que ninguém erre. O erro de um, no frescobol, é como ejaculação precoce: um acidente lamentável que não deveria ter acontecido, pois o gostoso mesmo é aquele ir e vir, ir e vir, ir e vir... E o que errou pede desculpas; e o que provocou o erro se sente culpado. Mas não tem importância: começa-se de novo este delicioso jogo em que ninguém marca pontos... A bola: são as nossas fantasias, irrealidades, sonhos sob a forma de palavras. Conversar é ficar batendo sonho pra lá, sonho pra cá... Mas há casais que jogam com os sonhos como se jogassem tênis. Ficam à espera do momento certo para a cortada. Camus anotava no seu diário pequenos fragmentos para os livros que pretendia escrever. Um deles, que se encontra no Primeiros Cadernos, é sobre este jogo de tênis: “Cena: o marido, a mulher, a galeria. O primeiro tem valor e gosta de brilhar. A segunda guarda silêncio, mas, com pequenas frases secas, destrói todos os propósitos do caro esposo. Desta forma marca constantemente a sua superioridade. O outro domina-se, mas sofre uma humilhação e é assim que nasce o ódio. Exemplo: com um sorriso: ‘Não se faça mais estúpido do que é, meu amigo’. A galeria torce e sorri pouco à vontade. Ele cora, aproxima- se dela, beija-lhe a mão suspirando: ‘Tens razão, minha querida’. A situação está salva e o ódio vai aumentando”. Tênis é assim: recebe-se o sonho do outro para destruí-lo, arrebentá-lo, como bolha de sabão... O que se busca é ter razão e o que se ganha é o distanciamento. Aqui, quem ganha sempre perde. Já no frescobol é diferente: o sonho do outro é um brinquedo que deve ser preservado, pois se sabe que, se é sonho, é coisa delicada, do coração. O bom ouvinte é aquele que, ao falar, abre espaços para que as bolhas de sabão do outro voem livres. Bola vai, bola vem – cresce o amor... Ninguém ganha para que os dois ganhem sempre. E se deseja então que o outro viva eternamente, para que o jogo nunca tenha fim..." Por Cristina Ruffino. Conversando com casais sobre suas diferenças e similaridades e como isso vem impactando o dia a dia da relação, vejo que muitas vezes estas percepções não se atualizam, eles se referem a diferenças e/ou similaridades de um tempo passado. Assim como, não se atualizam sobre o que cada um faz/pode fazer para ajudar o outro a se sentir melhor na relação considerando as diferenças.
Em geral eles/elas sabem quais são os resultados das ações d@ outr@ que não @s agrada, mas pouco sabem do que fazem que desagrada @ outr@ ou o que gostariam de pedir @ outr@ para se sentirem ajudad@s em um processo de convivência saudável. Algumas perguntas que costumam nos ajudar a refletir e conversar:
Você tem refletido sobre isso? Por Cristina Ruffino. Há uma diferença grande entre fazer uma queixa ou fazer um pedido. O posicionamento em que coloco @ outr@ quando eu me queixo del@ e onde me coloco é totalmente diferente, ainda que eu não tenha a intenção. Quando me queixo, @ posicion@ como:
O que conseguimos com queixas é a reação de defesa d@ outr@, porque, provavelmente el@ se sentirá atacad@ /criticad@ /julgad@. Além disto, a queixa fala do passado: o que @ outr@ fez / não fez. E não diz nada sobre o que eu desejo para o futuro. Se eu transformo a queixa em um pedido, identificando o que eu quero que aconteça, pelo que e colocando para @ outr@ isso de forma afirmativa, ou seja, ao invés de falar o que @ outr@ não fez, diga o que você gostaria que @ outr@ fizesse para ser bom para ambos. Exemplo: Ao invés de:
Com o pedido, eu posiciono @ outr@ como alguém que pode me compreender e que eu acredito que colaborará se puder. Ou seja, pedindo eu demonstro confiança n@ outr@ e na relação. Se @ outr@ não for poder me atender por algum motivo, el@ poderá me dizer. Ao fazer um pedido (e não uma queixa) eu também estarei focando no problema e não na pessoa. Veja a diferença:
Gostaria de observar se frente aos seus descontentamentos você tem levado para @ outr@ suas queixas ou seus pedidos? Obs. Nem sempre você conseguirá, tudo bem, você está em processo. Não desista só porque cometeu erros ou porque vê @ outr@ cometendo. Assuma que estão aprendendo e que haverá deslizes para velhos padrões. Observe, reconheça, respire e tente de novo. Lembre-se que não é pel@ outr@, é por você. Você merece conversas mais leves e mais produtivas. Se ofereça isso. Mãe e Pai ...
1 - Nunca esqueçam: eu sou a criança de vocês dois. Agora, só tenho um pai ou uma mãe com quem eu moro e que me dedica mais tempo. Mas preciso também do outro. 2 - Não me perguntem se eu gosto mais de um ou do outro. Eu gosto de “igual”modo dos dois. Então não critique o outro na minha frente, porque isso dói. 3 - Ajudem-me a manter o contato com aquele com quem não fico sempre. Marque o seu número de telefone para mim, ou escreva-me o seu endereço num envelope. Ajudem-me, no Natal ou no seu aniversário, para poder preparar um presente para o outro. Das minhas fotos, façam sempre uma cópia para o outro. 4 - Conversem como adultos. Mas conversem. E não me usem como mensageiro entre vocês - ainda menos para recados que deixarão o outro triste ou furioso. 5 - Não fiquem tristes quando eu estiver com o outro. Aquele que eu deixo não precisa pensar que não vou mais amá-lo daqui há alguns dias. Eu preferia sempre ficar com vocês dois. Mas não posso dividir-me em dois pedaços - só porque vocês se separaram. 6 - Nunca me privem do tempo que me pertence com o outro. Uma parte de meu tempo é para mim e para a minha Mãe; uma parte de meu tempo é para mim e para o meu Pai. Sejam consequentes aqui. 7 - Não fiquem surpreendidos nem chateados quando eu estiver com o outro e não der noticias. Agora tenho duas casas. E preciso distingui-las bem - senão não sei mais onde fico. 8 - Não me passem ao outro, na porta da casa, como um pacote. Conversem como vocês podem ajudar a facilitar a minha vida. Quando vierem me buscar ou levar de volta, deixe que eu perceba que podem conversar e se respeitar. 9 - Se vocês não puderem suportar o olhar do outro, combinem de me buscarem na casa de avós, na escola ou na casa de amigos. 10 - Não briguem na minha frente. Sejam, ao menos, tão educados entre vocês quanto seriam com outras pessoas, como vocês também exigem de mim. 11 - Não me contem coisas que ainda não posso entender. Conversem sobre isso com outros adultos, mas não comigo. 12 - Deixem-me levar os meus amigos na casa de cada um. Eu desejo que eles possam conhecer a minha Mãe e o meu Pai e achá-los simpáticos. 13 - Concordem sobre o dinheiro. Não desejo que um tenha muito e o outro muito pouco. Tem de ser bom para os dois, assim poderei ficar à vontade com os dois. 14 - Não tentem "comprar-me". De qualquer forma, não consigo “comer todo o chocolate” que eu gostaria. 15 - Falem-me francamente quando não dá para "fechar o orçamento". Para mim, o tempo é bem mais importante que o dinheiro. Divirto-me bem mais com um brinquedo simples e engraçado que com um novo brinquedo. 16 - Não sejam sempre "ativos" comigo. Não tem de ser sempre alguma coisa agitada ou nova quando vocês fazem alguma coisa comigo. Para mim, o melhor é quando somos simplesmente felizes para brincar e que tenhamos um pouco de calma. 17 - Deixem o máximo de coisas idênticas na minha vida, como estava antes da separação. Comecem com o meu quarto, depois com as pequenas coisas que eu fazia sozinho com meu Pai ou com minha Mãe. 18 - Sejam amáveis com os meus outros avós - mesmo que, na sua separação, eles tenham ficado mais do lado do seu próprio filho. Vocês também ficariam do meu lado se eu estivesse com problemas! Não quero perder ainda os meus avós. 19 - Sejam gentis com o novo parceiro que o outro encontrará ou já encontrou. Preciso também me entender com essas outras pessoas. Prefiro quando vocês não se vêem com ciúme. Para mim, será bom quando vocês dois encontrarem alguém que possam amar. Vocês ficariam mais felizes e não ficariam tão chateados um com o outro. 20 - Sejam otimistas. Vocês não conseguiram gerir o casamento de vocês - mas tudo poderá ficar bem novamente. Releiam todos os meus pedidos. Talvez vocês conversem sobre eles. Mas não briguem. Não usem os meus pedidos para censurar o outro, atacando-o pela forma com que fez comigo. Se vocês o fizerem, vocês não terão entendido como eu me sinto e o que preciso para ser feliz. Fonte - Tribunal de Família e Menores de Cochem-Zell/Alemanha Por Cristina Ruffino. Estamos imersos cotidianamente em conversas que possuem propósitos diferentes e conduzem a resultados diferentes. Cada qual serve em determinadas situações e não serve para outras. Um exemplo disto é o que acontece quando estamos em um Debate/Embate ou quando estamos em um Diálogo (distinção feita pela equipe do Public Conversations Project). Nas relações continuadas e cotidianas, raramente o debate/embate nos ajuda. O embate tem como efeito gerar competição, e quando estou em competição o único responsável para fazer dar certo a ideia que ganhar será quem a propôs, o outro se desresponsabiliza, já que não se sentiu ouvido e considerado.
O diálogo, por outro lado, gera cooperação e novas alternativas com senso de autoria e corresponsabilidade de ambos. Todos foram ouvidos e aquela decisão final é resultado da consideração de tudo que foi colocado para ser avaliado, ainda que originalmente a ideia tenha surgido a partir de um deles. Observe-se nas conversas cotidianas e reflita:
Escrito por Cristina Ruffino. Abordar a traição num relacionamento a partir da externalização do problema é uma maneira de encarar essa questão delicada sob uma luz diferente. Quando falamos de externalizar, estamos falando de tirar o problema de dentro do casal e colocá-lo como um desafio externo, algo que o relacionamento enfrenta, e não como uma falha intrínseca de uma das partes.
Imagine que a traição, em vez de ser um estigma ou uma mancha no caráter de quem traiu, é vista como um intruso que entrou no relacionamento. Essa abordagem não visa minimizar a dor ou a seriedade da situação, mas oferece um meio de lidar com ela de uma forma que não esteja carregada de acusações e ressentimentos pessoais. Ao externalizar a traição, o casal pode começar a ver a situação como um problema que ambos podem enfrentar juntos, em vez de um campo de batalha onde um é o agressor e o outro a vítima. Isso pode abrir caminho para discussões mais construtivas sobre o que levou à traição, sem que a conversa se torne uma sessão de culpa. Isso não quer dizer que a responsabilidade pela ação desaparece. Pelo contrário, reconhecer a traição como um problema externo permite que quem traiu assuma a responsabilidade de maneira mais objetiva, sem se perder em um turbilhão de auto-recriminação. Da mesma forma, para a pessoa traída, pode ser mais fácil expressar sua dor e decepção sem cair na armadilha do ressentimento cego. Esta perspectiva também pode ajudar na cura e na reconstrução do relacionamento. Em vez de se fixar na traição como um ato que define a relação, o casal pode começar a trabalhar juntos para fortalecer a confiança e a comunicação, abordando as falhas e vulnerabilidades que permitiram que o 'intruso' entrasse. Em suma, ao externalizar a traição, um casal pode encontrar um caminho menos doloroso e mais produtivo para lidar com essa situação extremamente difícil, concentrando-se na cura e no crescimento conjunto, em vez de culpar e acusar. De Roger Fisher,, William Ury e Bruce Patton, No livro "Como Chegar ao Sim", os autores nos apresentam um método de negociação baseado em princípios e não em barganhas ou ameaças. É sabido que quando fazemos uma negociação baseada em barganha ou pressão, ainda que ganhemos aquela negociação, deixamos a relação marcada pela sensação de injustiça, manipulação e desejos de vingança. Essas marcas se propagam para além das pessoas envolvidas diretamente naquele conflito, criando ao nosso redor um ambiente de vigilância e defesa de todos contra todos.
Na negociação baseada em princípios, entramos para o mundo da arte da negociação. Os autores desdobram a estratégia revolucionária da negociação baseada em interesses, também conhecida como a abordagem do ganha-ganha. Aqui, eles propõem um caminho para além do confronto, destacando quatro pilares fundamentais que prometem transformar nossas interações. 1. Separar as pessoas do problema: Imagine que, ao invés de encararmos o outro como um adversário, o vemos como um parceiro em potencial na resolução de uma questão comum. Não significa ignorar o problema ou ficar indiferente à questão que precisa ser resolvida, mas encarar juntos o problema. Este princípio encoraja a empatia e a cooperação, enfatizando a importância de distinguir entre as emoções e o problema em si. É um convite a reconhecer que, juntos, podemos ser arquitetos de soluções criativas, mantendo os relacionamentos não só intactos mas fortalecidos. 2. Concentrar-se nos interesses, não nas posições: Frequentemente, nos apegamos a nossas posições (o que entendemos como a solução) como se fossem extensões de nossa identidade. Mas, e se olhássemos além? Ao focar nos interesses que motivam nossas demandas, abrimos caminho para compreender verdadeiramente o que está em jogo. Esse entendimento mútuo pode ser a chave para desvendar soluções inesperadas, que satisfaçam a essência do que ambas as partes realmente necessitam. 3. Gerar opções de ganhos mútuos: Em vez de uma batalha onde só pode haver um vencedor, os autores nos convidam a ver a negociação como um terreno fértil para a criatividade. Aqui, o desafio é pensar fora da caixa, buscando soluções que beneficiem a todos. Isso não apenas aumenta as chances de um acordo bem-sucedido que perdurará, mas também promove um sentimento de realização compartilhada. 4. Usar critérios objetivos: Por último, mas não menos importante, é fundamental que as decisões tomadas sejam justas, baseadas não em caprichos pessoais ou pressões, mas em critérios objetivos e mutuamente aceitos. Isso estabelece um terreno comum de entendimento e respeito, pavimentando o caminho para decisões equilibradas e equitativas e a possibilidade de novos acordos. Ao abraçar esses princípios, a negociação se transforma de um confronto desgastante para um diálogo construtivo, onde todos os envolvidos têm a ganhar. Essa abordagem não apenas enriquece as relações, mas nos ensina uma lição valiosa sobre a natureza colaborativa do sucesso humano. Você já vivenciou situações de confronto que gerou mal estar para todos, se conhecesse estes princípios na época, acha que teriam sido úteis? Sabendo hoje que uma negociação pode ser feita a partir deste paradigma, gostaria de fazer diferente no futuro? Escrito por Cristina Ruffino. "Amar era pouco para mim, depois que eu experimentara a felicidade de apaixonar-me por ele. Eu queria movimento, e não uma fluência tranquila da vida." Márya - Tolstoy
Dentro das páginas de "Felicidade Conjugal", Tolstói nos convida a um íntimo mergulho nas profundezas das relações humanas, tecendo uma trama que gira em torno das emoções críveis e das percepções agudas de seus personagens. Não é apenas a história que se desenrola, mas um diálogo entre as almas, cada uma trazendo sua própria melodia para a sinfonia da vida. Com uma maestria que só Tolstói possui, ele nos conduz pelo labirinto do amor e do casamento, guiados pelos olhos de Márya, uma jovem cuja jornada do coração é tão cativante quanto complexa. Desde os primeiros capítulos, somos apresentados a sua vida pré-marital, marcada por uma doce amizade com Serguei Mikhailovich — uma presença constante e reconfortante, apesar da diferença de idade que os separa. A história se desdobra em duas partes distintas, como se fossem dois atos de uma peça, cada um revelando as diferentes facetas do amor. No início, é como se estivéssemos flutuando em um sonho, testemunhando o florescer de um amor entre Márya e Serguei, tão puro e radiante que parece desafiar a própria realidade. Tolstói, com seu toque único, pinta essa fase com cores vivas de alegria e paixão, capturando a essência embriagadora do amor juvenil. Mas como em qualquer sonho, vem o despertar. A segunda parte nos arrasta para um território mais sombrio, onde as sombras da desilusão começam a se insinuar na vida conjugal de Márya. O tempo, esse artesão de mudanças, começa a revelar as fissuras no idílio, expondo as diferenças que se alastram entre ela e Serguei. O que antes era um amor inquestionável, agora é um campo minado de desafios e sacrifícios, cada passo uma dança delicada entre o amor e a perda. Através da evolução de Márya, Tolstói não apenas narra uma história, mas desdobra um estudo profundo sobre a essência da felicidade conjugal. Ele nos mostra como as expectativas podem distorcer a realidade, como as circunstâncias podem remodelar nossos laços e como, no final, é a evolução de nossas relações que define a verdadeira essência do amor. Escrito por Cristina Ruffino. "O Eterno Marido" de Dostoiévski é uma obra intrigante que mergulha nas profundezas da psique humana. Com maestria, o autor desvenda os dilemas da moral e as repercussões de nossos atos. Combinando suspense, drama e uma pitada de ironia, Dostoiévski aborda questões como ciúme, mágoa e a intrincada teia das relações humanas. A narrativa se desenrola ao redor de três figuras centrais: Velchaninov, marcado por seus mistérios e tormentos; Trusotsky, o 'eterno marido', cuja obsessão beira o patético; e Nastassya, cuja presença é sentida ao longo da história, apesar de sua morte. O desenvolvimento do enredo nos convida a refletir sobre a culpa, a possibilidade de redenção e o passado persistente que nos assombra.
O título "O Eterno Marido" serve como uma metáfora para a repetição de padrões de comportamento e relacionamentos, sugerindo que nos tornamos perpetuadores de nossas próprias neuroses. Adotando uma perspectiva bakhtiniana, podemos apreciar o dialogismo da obra, a ideia de que cada diálogo é uma interação de múltiplas vozes, perspectivas e contextos. A história é tecida com diálogos ricos e tensos, revelando uma complexa dinâmica de rivalidade, ciúme e dependência. Essas interações desvendam camadas de significados, com personagens que trazem suas histórias e visões únicas, construindo uma trama de relações dialógicas que enriquecem a narrativa. A obra também explora o conceito de carnavalização, a subversão das hierarquias sociais e convenções por meio do humor e da paródia. Este aspecto questiona e inverte as relações de poder, provocando no leitor uma sensação de surpresa e reflexão. As interações entre os personagens evocam um teatro do absurdo, onde as normas sociais são desafiadas, expondo a fragilidade e arbitrariedade das conexões humanas. Em suma, "O Eterno Marido" é uma análise rica e multifacetada da condição humana, um estudo que continua a desafiar e a fascinar leitores pela sua complexidade e relevância atemporal. Escrito por Aglaia Ruffino Jalles da unboundededu.com Desde o início da pandemia de COVID-19, nossas vidas foram profundamente transformadas. Fomos obrigados a nos distanciar, a adotar o isolamento social e a compensar como nos relacionamos com o mundo. No entanto, à medida que a vacinação avançou e a situação se estabilizou, surgiu uma nova fase: a socialização pós-pandemia! Um novo valor para as conexões A pandemia nos fez perceber o valor inestimável das conexões humanas. Durante meses, enfrentamos a solidão e a separação, tornando-nos mais conscientes da importância do contato humano. Agora, à medida que começamos a nos reconectar com o mundo, essas conexões ganham um significado mais profundo. A interação nos incentiva a não apenas abraçar os momentos pessoais, mas também a apreciar cada encontro, seja com amigos antigos ou com pessoas que conhecemos pela primeira vez. A alegria de simplesmente compartilhar um café ou caminhar juntos no parque se torna uma experiência mais valiosa do que nunca. Enfrentando o Desafio da Ansiedade SocialNo entanto, a socialização pós-pandemia também vem com os seus desafios. Para muitos, a ansiedade social se intensificou durante o período de isolamento. Sentir-se desconfortável ao interagir com os outros ou temer aglomerações tornou-se uma experiência comum. Por isso, ao passo que nos reconectamos, é vital ser gentil consigo mesmo e com os outros. O respeito pelos limites individuais e a compreensão das diferentes velocidades de adaptação à socialização são cruciais. É um momento de reencontro e renovação. Valorizamos mais as conexões humanas, enfrentamos desafios com empatia e buscamos um equilíbrio saudável em nossas vidas. Enquanto navegamos por este novo capítulo, lembramos que a força da humanidade está em nossa capacidade de nos adaptar, crescer e apoiar uns aos outros!
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Cristina RuffinoSou Pedagoga (Unicamp), Mestre em Psicologia (Unicamp), doutora em Psicologia pela USP-RP. Arquivos
Dezembro 2024
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